Religião e moral
A dimensão social da religião exprime-se em códigos e normas de comportamento que não só regulam a forma como se deve desenvolver o culto, mas também dão à vida social orientações determinadas (constituição de uma moral). Diversas religiões regulam as acções humanas, distinguindo o que é permitido do que é proibido, ou seja, o bem do mal e, em termos históricos, a coabitação entre moral e religião é um facto indesmentível, como o texto que citaremos documenta:
«Adão e Eva desobedecendo a Deus no Jardim do Éden e sendo castigados com o sofrimento e a morte que serão uma herança de todas as gerações humanas; Moisés recebendo os Dez Mandamentos da mão de Deus e entregando-os ao povo de Israel como leis - normas - que exigiam absoluto respeito; os profetas Amos, Isaías e Jeremias avisando o povo israelita de que desobedecer à lei de Deus implicava condenação e destruição; o Sermão da Montanha, a Parábola do Bom Samaritano, o ensinamento de Jesus exortando-nos a amar Deus de todo o coração, o nosso próximo como nós mesmos e, inclusive, estendendo esse amor aos nossos inimigos; visões, no livro do Apocalipse, do Juízo Final mediante o qual
Deus julgaria homens e mulheres pelos seus actos neste mundo; a esperança da bem-aventurança no Céu e o temor do Inferno - tudo isto marcou profundamente a consciência e influenciou o comportamento do homem ocidental durante, aproximadamente, dois milénios. Para a cultura e civilização ocidentais, a moralidade foi identificada com a religiosidade, a imoralidade com o pecado, as normas fundamentais com mandamentos divinos e a vida moral, em geral, definida como a relação pessoal com um parente celeste. Agir imoralmente era, essencialmente, desobedecer a Deus. Por exemplo, David, depois de ter cometido adultério com Betsabé e de ter preparado a morte do marido desta (Uries), diz a Deus: "Contra ti e só contra ti eu pequei" (Salmo 51).
Quer pensemos no desgraçado pária (intocável) de Calcutá aceitando a sua condição miserável como destino (karma), no muçulmano shiita guerreando em nome de Alá, nas rígidas regras alimentares do Judeu ou no Cristão dedicado à caridade em nome do Senhor, a religião dominou de tal modo o horizonte moral do homem que as duas dimensões se tornaram indistinguíveis.
Houve e há, sem dúvida, excepções: o confucionismo na China é essencialmente uma moral secular; há versões não teístas do budismo e os filósofos gregos, em geral, consideraram os problemas morais independentemente da religião.
Mas, para a grande maioria, durante a maior parte da história da humanidade, a moralidade identificou-se com a religião, com os mandamentos de Deus.»
Louis P. Pojman, Ethics - Discovering right and wrong, I. T. P., pp. 234-235.
Exercícios
Com base na informação dada e noutra que já possua ou venha a obter, elabore uma breve reflexão sobre a relação entre moral e religião. Sugerimos que pense nos seguintes problemas:
a) Quando recorremos à revelação como base da autoridade moral, queremos dizer que um acto é justo porque Deus - segundo o revelado num livro sagrado - o ordena ou que Deus o ordena porque é justo? Muito depende de qual destas alternativas escolhemos...
b) A religião regula as relações entre o homem e Deus. Deve regular as relações entre os homens, dar orientação normativa às relações sociais?
c) A religião, prova-o a história, pode ser uma força para o bem e para o mal.
d) Se a moral tiver uma origem divina, se partirmos da hipótese de que os mandamentos morais são da autoria de Deus e por ele revelados, devemos questionar-nos sobre a revelação verdadeira: a recebida
por Moisés, por Maomé, a revelada por Cristo?
e) Será que os seres humanos são incapazes por si só de fundar uma moral universalmente válida? Estaremos condenados à imoralidade e ao relativismo moral se Deus não existir?
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