NIETZSCHE E O CRISTIANISMO (I)
"No cristianismo nem a moral nem a religião têm qualquer ponto de contacto com a realidade.
Este mundo (o mundo religioso) de pura ficção distingue-se do mundo dos sonhos devido a uma característica que nada abona a seu favor: é que este último (o mundo dos sonhos) reflecte a realidade, enquanto que o outro (o mundo religioso) falsifica-a, desvaloriza-a, nega-a.
Este mundo de ficção está totalmente baseado no ódio à natureza, é a expressão de um profundo mal-estar provocado pela realidade (...) Quem é que tem necessidade de mentir (de inventar ficções) para se evadir da realidade? Aquele a quem ela faz sofrer. Mas sofrer com a realidade significa que se é uma realidade falhada.
Fui o primeiro a ver a verdadeira oposição que existe entre, por um lado, o instinto degenerado que de uma forma subterrânea e rancorosa (vingativa) e, por outro lado, uma forma de aquiescência superior, nascida da plenitude e da exuberância da vontade, um sim sem reservas à vida, mesmo à dor, à falta, a tudo o que a vida tem de chocante, enigmático (angustiante), problemático".
A filosofia de Nietzsche é um violento ataque contra a religião, sobretudo contra o cris- tianismo, cujo verdadeiro fundador é S. Paulo, essa grande infelicidade histórica,segundo o filósofo alemão. Mas a religião cristã não é criticada como facto isolado. Ela é o momento culminante e extremo do idealismo (da cobardia perante a realidade) e do moralismo (da transformação do que é natural em condenável). O cristianismo ("platonismo para o povo") é o herdeiro do dualismo platónico-socrético entre o ser e o devir, entre o inteligível e o sensível, o "mundo verdadeiro" e o mundo da aparência. O "mundo inteligível" de Platão transforma-se, com o cristianismo, no "Reino de Deus". O mundo da beatitude, da "paz de espírito" é o mundo superior. Porquê? Porque, ao contrário "deste mundo" (o da mudança, da intrínseca ligação entre bem e mal, entre alegria e dor), não faz sofrer: é o mundo do bem.
O método genealógico de Nietzsche (que consiste em revelar o tipo de vida ou de von- tade que se manifesta nas ideias filosóficas, morais e religiosas) revela que o "Reino de Deus" é uma ficção nociva. Foi inventado pelos incapazes de enfrentar o carácter complexo e enigmático da vida "deste mundo" não só para se consolarem da sua impotência mas intoxicarem os fortes, levando-os a desvalorizar a sua natureza, os seus instintos, a sua fidelidade à terra. Assim, a religião é pior que o sonho: este deforma a realidade; a religião e a moral cristãs negam a natureza, condenam tudo o que é vital, natural, sensível. A grande corrupção levada a cabo pelo cristianismo consistiu em transformar tudo o que é "natural" em "condenável". O crente é um decadente, um doente, uma "realidade falhada". A religião é uma defesa contra a realidade que nos faz sofrer, e que, inventando, no delírio próprio dos impotentes, um "outro mundo", desvaloriza e nega "este mundo": o cristianismo é um niilismo, nega a vida (os instintos vitais, a sexualidade - fonte da vida) em nome de Deus, puro Espírito. "A vida acaba onde começa o Reino de Deus'.
Refugiando-se nesse mundo imaginário, o ''fraco'' vai qualificar-se como "bom" e denegrir os ''fortes'' (os que dizem sim incondicionalmente à vida, a "esta vida"), fazendo-os passar por "maus", injustos. Esta contaminação dos fortes é obra do "padre ascético" que avalia a vida desvalorizando-a, e ao mesmo tempo transformando-a, baseado na ideia de pecado original, num calvário, numa mortificação necessária à redenção. "Esta vida" deve ser vivida não por si mesma mas como meio doloroso de expiação do pecado. O Deus no qual se funda toda esta corrupção é indigno de crença, um contra-senso. A sua morte deve ser declarada para que o homem moderno ("aborto sublime"), ser fatigado e decadente, cuja vontade é negativa, seja ultrapassado, superado (não no sentido hegeliano). O amor à vida, a fidelidade à terra, a negação daquilo que negava a vida, a expansão da vitalidade atrofiada pelos antigos valores (antivalores), serão característicos do super-homem. É ele a verdadeira redenção, a "transmutação dos valores", a ultrapassagem da "antinomia dos valores" carac- terística do platonismo e do cristianismo, ou seja, da cultura ocidental em qeral..
Augusto Cury escreve sobre Nietzsche:"Nietzsche era de fato um ateu? Queria destruir a idéia de Cristo do seu imaginário? Achava uma estupidez psicológica o ser humano procurar por Deus nessa curtíssima trajetória existencial? Considerava um desperdício ocupar a mente com as idéias sobre Deus? Não! Nietzsche procurava preparar os solos da sua psique para conhecer os mistérios que cercam a vida. Era alguém inconformado com o superficialismo. Nele havia um desespero intelectual em busca do Autor da existência.Sua ansiosa procura foi um dos exemplos mais espetaculares da inquietação de um ser humano imerso nos pântanos da solidão. Para discutir esse assunto, quero transcrever e depois comentar uma "oração filosófica" feita pelo próprio Nietzsche, e que é muito pouco conhecida. Esta oração foi traduzida pelo ilustre Leonardo Boff diretamente do alemão (Boff, 2000):***"Antes de prosseguir em meu caminho e lançar o meu olhar para a frente, uma vez mais elevo, só, minhas mãos a Ti na direção de quem eu fujo.A Ti, das profundezas de meu coração, tenho dedicado altares festivos para que, em cada momento, Tua voz me pudesse chamar.Sobre esses altares estão gravadas em fogo estas palavras: "Ao Deus desconhecido."Teu, sou eu, embora até o presente tenha me associado aos sacrílegos.(...)Tu, o incompreensível, mas meu semelhante, quero Te conhecer, quero servir só a Ti.***(...)Nietzsche se debate tentando fugir de Deus para seguir sua história e traçar seus próprios caminhos. Mas não consegue fugir de si mesmo. Os caminhos se cruzam. Só, num mergulho introspectivo e solitário, o filósofo se aproxima do Autor da existência.(...)
ResponderEliminaro Deus desconhecido. Aquele que perturbou a mente de intelectuais e deixou em suspense a inteligência dos filósofos.(...)Embora tenha criticado a religiosidade com virulência ímpar e fosse contra a submissão cega, para nosso espanto declara "Teu, sou eu", apesar de até aquele momento ter criticado as idéias ligadas a Deus. Quem pode explorar as vielas da mente desse filósofo?
Quando todos pensavam que Nietzsche fosse o mais radical dos ateus, na realidade era um filósofo desesperado em busca de uma experiência radical com um Deus vivo, e não com o deus construído pelos seres humanos.
Nietzsche era um anti-religioso que, com uma coragem única, anunciou a morte de Deus. Mas não é a morte do Deus do Pai-Nosso, mas do deus criado pelo ser humano, o deus construído à imagem e semelhança do seu individualismo, arrogância e autoritarismo. O deus que é um joguete nas mãos humanas, que faz guerras, que subjuga e exclui.
Em sua oração, o filósofo tenta separar o deus humano que o decepcionou, do Deus concreto que alicerça a existência. Tentou fugir de ambos, mas agora se sente compelido a procurar o Deus real. Não vê sentido se não encontrá-Lo. Inquieto com suas próprias conclusões, Nietzsche se lança como um raio em direção a explicações mais profundas.
Com uma humildade raramente vista entre os mais célebres pensadores, ele reconhece sua pequenez e clama em alta voz e sem medo: "Eu quero Te conhecer, desconhecido!"
Ele clama de forma imperativa, como se tivesse em sintonia com o tempo verbal usado na oração do Pai-Nosso. Ele não está no alto da montanha, mas no cume dos questionamentos. Nesse cume, deixa-se refrescar pela brisa da serenidade. Não perdeu sua capacidade de aprender.(...)Ateus e não-ateus, independentemente de uma religião, sempre tiveram Deus como um tema central em suas inteligências. Disseram palavras que, embora nunca pronunciadas, expressaram estas idéias: "Deus, quem és Tu? E quem sou eu? Penetra o meu pensamento. Invade meu orgulho, irriga meu radicalismo com o orvalho da humildade antes que se dissipe meu tempo e eu me torne uma terra seca e estéril. Ensina-me a ouvir no silêncio e a enxergar na ausência da luz. Eu quero Te conhecer."
Os segredos do Pai-Nosso / Augusto Cury. - Sextante, 2006.ISBN 85-7542-256-1;Capitulo13 Na internet digitalizado por Levita Digital.
Tanto tempo depois de Nietzsche, tudo se comprovou!
ResponderEliminarO cristianismo é uma desgraça para a humanidade.
Ele é um gênio incomparavel, tém meu credito, compromissi com o bom censo, está Nêle!!!
ResponderEliminarNietzsche, refere-se sim, ao deus criado pelo homem, por selvagens semi analfabetos, e ele não luta pra se libertar de deus, apenas o elimina! O homem cria um deus fraco, niilista, e para Nietzsche isso tem que ser removido da estória.
ResponderEliminarSimples assim, sem muita especulação!