quinta-feira, 14 de abril de 2011

O RACIONALISMO DE DESCARTES (V) - A DÚVIDA METÓDICA


O RACIONALISMO DE DESCARTES (V)
A DÚVIDA METÓDICA
A dúvida como instrumento essencial na procura da verdade
Decidimos derrubar o edifício do saber tradicional e encontrar o seu novo fundamento. Isto quer dizer que vamos submeter todos os conhecimentos até agora alcançados ao exame rigoroso e impiedoso da dúvida. Tal não significa que vamos examiná-los um a um. Seria uma tarefa interminável. Vamos, isso sim, submeter ao exame da dúvida os princípios fundamentais sobre os quais os conhecimentos do sistema do saber tradicional assentam.
Vamos então submeter todo o saber estabelecido à prova da dúvida, para ver se encontramos algum conhecimento do qual não possamos duvidar o mínimo que seja. Como veremos daqui a algumas páginas, esse conhecimento que vai resistir a todo e qualquer ataque da dúvida será o novo princípio do novo sistema do saber, a alavanca para novos conhecimentos e para uma nova ordenação dos conhecimentos.
Já que a dúvida é tão importante devemos estabelecer previamente as suas características:
1 - A dúvida é catártica ou purificadora porque quer libertar a razão dos falsos princípios, quer evitar que se considerem princípios do saber conhecimentos que não merecem esse nome. A sua função primordial é libertar a razão dos falsos pontos de partida do saber. Se queremos um edifício científico com um fundamento ou alicerce absolutamente verdadeiro, o certificado de verdade não pode ser passado sem que antes submetamos aquilo que é considerado fundamento à prova rigorosa da dúvida. Assim se compreende que absolutamente verdadeiro seja sinónimo de absolutamente indubitável (absolutamente claro e distinto) ou seja, um conhecimento que por mais que dele tentemos duvidar não pode ser posto em causa, resiste.

2 - A dúvida é económica porque não se pretende questionar centenas de conhecimentos um a um, mas unicamente as bases sobre as quais esses conhecimentos assentam.

3 - A dúvida é universal porque põe à prova a solidez das bases de todos os conhecimentos estabelecidos.

4 - A dúvida é hiperbólica porque em qualquer dos seus níveis de aplicação é orientada por uma dupla regra que ordena o seguinte:
a) Considerar como absolutamente falso o que for minimamente duvidoso.
b) Considerar como sempre enganador aquilo que alguma vez me engane.

5 - A dúvida é metódica no sentido em que é a forma de cumprir a primeira regra do método (considerar como verdadeiro somente o que for absolutamente indubitável, i.e., claro e distinto). A dúvida é estabelecida com a função de, submetendo os conhecimentos a um exame rigoroso, encontrar algo que resista a essa prova e assim mostre ser um conhecimento indubitável.

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