quinta-feira, 14 de abril de 2011

O RACIONALISMO DE DESCARTES (XI)


O RACIONALISMO DE DESCARTES (XI)
EIS QUE SURGE UM PROBLEMA: COMO PASSAR DAS IDEIAS DAS COISAS AO CONHECIMENTO DE REALIDADES OBJECTIVAS
No momento do Cogito há um importante ensinamento: só no pensamento se revela aquilo a que chamamos realidade. As coisas existem sob a forma de ideias. Existem nas ideias que delas temos, enquanto meros conteúdos ou representações mentais. A realidade das coisas é a do próprio pensamento, i.e.,as coisas existem não em si (fora do pensamento) mas sim enquanto pensadas.
Quando digo «penso que a rosa é uma flor bonita» eu não estou a afirmar a realidade exterior da rosa mas a sublinhar que a existência é atributo das minhas ideias. Não posso duvidar que a ideia de rosa existe. Posso contudo duvidar que a essa ideia corresponda alguma realidade exterior, i.e., que a rosa exista realmente, independentemente do meu pensamento.
A certeza do Cogito limita-se à existência do nosso próprio pensamento. O problema da certeza, relativamente aos objectos exteriores ao meu pensamento, permanece. Enquanto não provar que um ser omnipotente não pode ser enganador está fechada a via de acesso à solução do problema.
Tenhamos contudo confiança. Se o Cogito é o primeiro princípio do sistema do saber é porque dele se podem tirar outros conhecimentos, fazer avançar o saber.
Para chegar à descoberta de algo diferente de si o ser pensante só tem um ponto de partida seguro: o seu pensamento e as ideias que nele estão. Por exemplo, o mundo pode estar em dúvida mas a ideia de mundo, essa existe e isso é tão verdadeiro como existir o sujeito que tem essa ideia.
Temos assim uma base para a investigação de novos conhecimentos: o pensamento como actividade e as ideias sem as quais ele não se exerce.
Como poderá o sujeito pensante, isolado, como que instalado no vazio, chegar à afirmação de realidades exteriores ao seu pensamento?
Por um esforço de reflexão sobre si mesmo, analisando o seu interior, explorando os seus conteúdos (as ideias), o sujeito tentará verificar se algumas delas são possuidoras de tais características que permitam romper a clausura do pensamento e «invocar» uma realidade diferente do sujeito pensante. Veremos que só uma ideia terá este privilégio.
A realidade que ela representa será a primeira realidade que Descartes encontrará depois da sua. O princípio que orienta a procura de uma realidade diferente do sujeito pensante é o seguinte: toda a ideia que me representar um ser mais perfeito do que eu exigirá como seu autor ou causa um outro ser que não eu mesmo.
A ideia de Deus, de ser perfeito ou substância infinita, é a única ideia que, encontrada a sua origem, me vai permitir ultrapassar o solipsismo (existir somente o sujeito pensante e as suas ideias).

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